CONVERSANDO SOBRE ARTERITE DE TAKAYASU
Dr(a), o que é Arterite de Takayasu?
A Arterite de Takayasu é um tipo de vasculite sistêmica autoimune que acomete a aorta (a maior artéria do corpo humano), seus ramos arteriais principais e a artéria pulmonar. Durante a evolução da Arterite de Takayasu, o processo inflamatório observado na parede destes vasos pode levar a uma redução do seu calibre gerando estenose ou até mesmo a oclusão dos mesmos. Além destas alterações, pode acontecer um enfraquecimento da parede da artéria em pontos localizados dando origem a dilatações conhecidas como aneurismas.
Durante muito tempo, acreditava-se que esta doença fosse restrita aos orientais, mas com o passar dos anos a sua ocorrência foi observada em outros povos. É uma vasculite muito rara, sua frequência varia de 1,2 a 2,9 casos por um milhão de habitantes ao ano, sendo a maior incidência observada no Japão e a menor nos EUA.
As mulheres são mais acometidas que os homens, elas representam cerca de 75 a 90% dos casos em diferentes casuísticas.
Habitualmente, os sintomas se iniciam antes dos 40 anos, no entanto, como as alterações mais típicas desta vasculite se desenvolvem de forma lenta, muitas vezes, seu diagnóstico é feito anos depois do seu início.
Dr(a), o que causa esta inflamação das artérias na Arterite de Takayasu?
Até o momento, a causa da Arterite de Takayasu é desconhecida. Acredita-se que fatores genéticos e ambientais estejam envolvidos na ativação do sistema imunológico e no desenvolvimento do processo inflamatório observado na parede dos vasos acometidos nesta vasculite.
Uma pesquisa realizada no Japão com o objetivo de investigar a influência de fatores genéticos relacionados a Arterite de Takayasu, revelou uma associação do HLA B52 com um risco aumentado de desenvolver esta vasculite naquela população.
Também existem estudos que tentaram correlacionar agentes infecciosos, por exemplo: o bacilo da tuberculose e o estreptococos, como fatores deflagradores das alterações inflamatórias observadas na Arterite de Takayasu. No entanto, ainda não existe comprovação da associação destes como fatores causais desta vasculite.
Por tratar-se de uma doença rara, é mais difícil realizar pesquisas e produzir evidências sobre ela. Para se alcançar este objetivo é preciso tempo, muita dedicação e colaboração entre as diferentes sociedades de pesquisa no mundo.
Dr(a), quais são os sintomas causados pela Arterite de Takayasu?
No início da Arterite de Takayasu, os sinais e sintomas são bastante inespecíficos, como fadiga, tontura, dor de cabeça, dores articulares, febre, emagrecimento e palpitações.
Na medida em que o processo inflamatório na parede da artéria evolui levando a estenose do vaso, surgem sintomas relacionados a redução da perfusão sanguínea naquela região, pois oxigênio e nutrientes não chegam normalmente. Algumas vezes, a estenose da artéria acometida ocorre tão lentamente, que o organismo desenvolve uma circulação colateral para compensar a redução do fluxo observada na artéria inflamada, sendo os sintomas menos expressivos quando isso acontece.
Desta maneira, os sintomas e sinais da Arterite de Takayasu são variáveis e dependem de qual artéria foi acometida. No caso do acometimento de vasos que nutrem os membros, podem ser observados dor, redução da temperatura, alteração de sensibilidade e força, diminuição, ou até mesmo ausência, de pulsos periféricos palpáveis e dificuldade de mensurar a pressão arterial. Quando a artéria acometida é responsável pela irrigação de órgãos como sistema nervoso, pulmões, intestino e rins, podem ocorrer redução da acuidade visual, desmaio, convulsão, acidente vascular cerebral (AVC), falta de ar, dor no peito, dor abdominal, diarréia e hipertensão arterial.
Dr(a), como se faz um diagnóstico de Arterite de Takayasu?
Para suspeitar de um caso de Arterite de Takayasu é preciso estar atento as queixas clínicas relatadas pelo paciente durante a consulta e realizar um exame clínico detalhado, com atenção especial a medida da pressão arterial em braços e pernas e palpação de pulsos periféricos. Diante de um caso suspeito, podem ser solicitados exames de laboratório e de imagem.
Os exames de laboratório, como hemograma, provas de atividade inflamatória (velocidade de hemossedimentação (VHS), proteína C reativa (PCR), ferritina) embora possam mostrar alterações, estas são inespecíficas, pois podem ser encontradas também em outras doenças. Embora o fator antinuclear (FAN) e fator reumatóide (FR) possam ser encontrados em alguns casos numa titulação baixa eles são pouco úteis para o diagnóstico de Arterite de Takayasu.
Para a avaliação do acometimento vascular são utilizados ultra-som doppler colorido de vasos arteriais, angiotomografia, angioressonância magnética e a arteriografia convencional- este último tem sido menos utilizado na medida em que os demais exames se tornaram mais acessíveis. Em algumas situações, pode ser interessante realizar mais de um método de imagem, pois cada um deles tem vantagens e desvantagens quanto as informações que podem oferecer sobre a Arterite de Takayasu.
Desta maneira, o diagnóstico é feito pelas características clínicas e alterações observadas em exames laboratoriais e de imagem, que em conjunto sejam compatíveis com Arterite de Takayasu.
Dr(a), como se trata a inflamação das artérias na Arterite de Takayasu?
O tratamento das alterações inflamatórias observadas nas artérias acometidas na Arterite de Takayasu é feito inicialmente com o uso de corticóide por via oral. Esta medicação também controla os sinais e sintomas relacionados a doença ativa, como por exemplo febre, fadiga, cefaléia e artralgias. Na medida em que a atividade inflamatória é controlada, inicia-se a redução da dose do corticóide até a sua suspensão.
Outros medicamentos imunossupressores, como o metotrexato e a azatioprina, são úteis para auxiliar no controle da atividade inflamatória da doença e como terapia de manutenção após a retirada do uso do corticóide. Em algumas situações, outros imunossupressores como a ciclofosfamida, a leflunomida e o micofenolato mofetil podem ser utilizados como alternativa ao metotrexato e azatioprina.
Quando não se observa o controle satisfatório da atividade inflamatória na Arterite de Takayasu e progressão do acometimento vascular, apesar do tratamento com as medicações citadas acima, o uso de imunobiológicos, como o infliximabe e o tocilizumabe, pode ser útil para se alcançar o controle da inflamação.
Dr(a), além do tratamento medicamentoso, o que mais é importante para controlar a Arterite de Takayasu?
Além do uso de medicamentos imunossupressores, é preciso atenção quanto ao controle da pressão arterial, glicemia, colesterol e triglicérides.
A hipertensão arterial é comum em pacientes com Arterite de Takayasu e seu controle é fundamental para evitar danos vasculares adicionais. No entanto, em alguns casos pode ser difícil aferir corretamente a pressão arterial no membro superior direito, como habitualmente se faz, quando há comprometimento de seus vasos arteriais. Caso não seja possível fazê-lo, é importante checar os pulsos periféricos nos outros membros e checar neles a pressão arterial.
Manter um bom nível de glicemia, colesterol e triglicérides também é importante pelos mesmos motivos, pois quando estão elevados são fatores de risco adicionais para dano vascular relacionado a aterosclerose.
Caso seja fumante, vale a pena rever este hábito e buscar ajuda para interrompê-lo, pois o tabagismo também é fator de risco adicional para doenças cardiovasculares.
Portanto, é preciso investir num estilo de vida mais saudável, com uma dieta equilibrada, prática regular de atividades físicas supervisionadas, para manter um bom condicionamento físico e peso adequado.
Dr(a), o que fazer quando a inflamação vascular progride e causa estenose, oclusão e a formação de aneurisma, apesar do tratamento?
Nem sempre o controle bem sucedido com a medicação e controle de fatores de risco adicionais a doenças cardiovasculares acontece, de maneira que alguns pacientes apresentam progressão da doença com a formação de estenoses, oclusões arteriais e/ ou aneurismas. Estes casos devem ser cuidadosamente avaliados em parceira com um cirurgião vascular. Conforme o tipo de lesão vascular encontrada, podem ser indicados procedimentos com o objetivo de restaurar fluxo sanguíneo adequado para a região afetada. Alguns destes procedimentos são realizados por cirurgias convencionais e outros por cateterismo, a escolha de qual é a melhor estratégia é feita caso a caso.
Além das alterações vasculares citadas acima, podem ocorrer insuficiência cardíaca e alterações na válvula aórtica (esta válvula se localiza entre o ventrículo esquerdo do coração e primeira porção da aorta, chamada de aorta ascendente). Nestas circunstâncias são necessários ajustes no tratamento medicamentoso, com a inclusão de medicamentos que atuem de maneira a melhorar o funcionamento cardíaco.
Quando estas complicações acontecem, é importante que o paciente seja acompanhado por uma equipe médica multidisciplinar, com reumatologista, cardiologista e cirurgião vascular, apoiada por profissionais da nutrição e reabilitação física. Algumas vezes, é necessário também o apoio de profissionais da saúde mental, pois internações e procedimentos podem ser bastante estressantes.
Dr(a), quais os cuidados com a gravidez numa mulher com Arterite de Takayasu?
Como a Arterite de Takayasu é mais frequente em mulheres em idade fértil, alguns cuidados são necessários com relação a gravidez. Assim como em outras doenças reumáticas, é de bom senso evitar uma gestação quando se reconhece a presença de atividade inflamatória, sendo mais prudente planejá-la para as fases de melhor controle. Além disso, alguns medicamentos imunossupressores eventualmente utilizados no tratamento, como o metotrexato, exigem uso adequado de método contraceptivo, pois apresentam riscos ao desenvolvimento do feto. Sendo assim, é importante planejar a gravidez para que ajustes na medicação sejam feitos para evitar riscos ao desenvolvimento e crescimento fetal.
Na literatura médica, existem trabalhos descrevendo gravidezes bem sucedidas e sem complicações em pacientes com Arterite de Takayasu e outros com relatos de exacerbações de sinais e sintomas desta vasculite numa frequência de 25 a 60% das gestações. As complicações descritas durante a gestação em mulheres com Arterite de Takayasu foram: pré-eclampsia, insuficiência cardíaca, acidente vascular cerebral, défict de crescimento intra-uterino e aborto.
Para minimizar os riscos de complicações na gestação, é importante realizar consultas regulares com o obstetra e reumatologista; em alguns casos, pode ser necessário também realizar o acompanhamento com um cardiologista. Por ocasião do parto, o anestesista deve compor a equipe, para planejar a melhor forma de monitorar a gestante e o bebê durante o parto. Estes cuidados são fundamentais para que se tenha uma estratégia de acompanhamento e ajuste de conduta de acordo com a necessidade. Afinal, todos desejam uma gestação bem sucedida!
Para incluir ao longo da série: Curiosidade:
A Arterite de Takayasu foi descrita em 1908 por um oftalmologista chamado Mikito Takayasu, por isso esta vasculite foi batizada com este nome.
Numa reunião anual da Sociedade de Oftalmologia Japonesa, o Dr Mikito apresentou um caso de um paciente com alterações muito peculiares nos vasos da retina. Na sequência, outros dois oftalmologistas observaram alterações semelhantes em pacientes com déficit de pulso.
A curiosidade por compreender os motivos destas alterações vasculares conduziram a estudos que permitiram a melhor caracterização da nova doença.