CONVERSANDO SOBRE COMPETÊNCIAS SOCIOEMOCIONAIS

Competências Socioemocionais e Mundo BANI

Vivemos num mundo em constante transformação. Até pouco tempo atrás, o termo mais utilizado para descrever a dinâmica das rápidas transformações e desafios globais era Mundo VUCA (acrônimo com as palavras da língua inglesa: Volatility, Uncertainty, Complexity e Ambiguity), o qual se referia a um mundo volátil, incerto, complexo e ambíguo. Entretanto, a pandemia da COVID19 trouxe tantos impactos na organização das relações e sistemas, nos colocando numa espécie de caos, que agora o mundo é BANI: Brittle, Anxious, Non-linear, Incomprehensible (frágil, ansioso, não linear, incompreensível)! 

Como estamos sujeitos a mudanças rápidas e repentinas em nossas vidas, isso nos coloca em situação de instabilidade, a qual se relaciona com a ideia de fragilidade. As incertezas, relacionadas a esta instabilidade dos dias de hoje, gera medo e sensação de urgência, levando a ansiedade. A complexidade das relações de causa e efeito não implica em proporcionalidade de altos e baixos, ou seja, não há linearidade. E, embora tenhamos uma quantidade cada vez maior de informações disponíveis, isso não nos permite compreender aquilo que antes já considerávamos ambíguo. 

Neste contexto, reflita sobre diferentes situações no seu dia a dia, tanto na vida profissional como pessoal, em que teve que aprender novos conceitos e habilidades para enfrentar desafios, precisou se concentrar para concluir uma tarefa, teve que se expor e comunicar suas ideias e sentimentos, gerenciou um conflito ou se deparou com limites e teve que lidar com suas frustrações. Se antes do Mundo Bani já não era fácil, agora então... 

Além das crianças e adolescentes, estamos todos sendo intimados a nos aperfeiçoar nas competências socioemocionais, se, de fato, quisermos, um mundo melhor com mais bem estar para todos.

 

Competências Socioemocionais e Formação Integral 

O desenvolvimento das competências socioemocionais é de extrema relevância para a formação integral do indivíduo. No Brasil, desde 2020, tornou-se obrigatória a inclusão do desenvolvimento destas competências na base curricular das escolas. O objetivo do desenvolvimento das competências socioemocionais, que envolve o gerenciamento das próprias emoções, é aprimorar a forma de pensar, agir e se relacionar do indivíduo, tornando-o capaz de tomar decisões, enfrentar desafios e ser perseverante nos seus objetivos.

Estudos e pesquisas foram realizados para a elaboração de indicadores e programas de intervenção para estimular o desenvolvimento socioemocional nas escolas, por meio de atividades com os alunos, com os professores e as famílias. 

Um dado importante, que considero o mais relevante das pesquisas nesta área, é que as habilidades necessárias para desenvolvimento das competências socioemocionais podem ser aprendidas e desenvolvidas. Isto quer dizer que, independente das características de personalidade de cada um, todos podem ser estimulados a desenvolver recursos emocionais para desenvolverem relações mais saudáveis consigo mesmo, com os outros e terem ampliadas a sua capacidade de observação, reflexão e elaboração de ideias, pensamentos e emoções.

Dentre os programas desenvolvidos com estes objetivos, podemos citar: o Social andEmotional Learning (SEL, desenvolvido nos Estados Unidos, conhecido no Brasil como Aprendizagem Socioemocional- ASE) e o Social and Emotional Aspects of Learning, desenvolvido na Inglaterra. Na Europa, na Austrália e nas Américas, inclusive a Latina, observa-se uma expansão nos programas educacionais baseados na ASE, sustentados por evidências pela CASEL (Collaborative for Academic, Social and EmotionalLearning). 

Podemos agrupar as competências socioemocionais destes programas em cinco categorias: autoconhecimento, autocontrole, habilidades de relacionamento, consciência social e tomada de decisão responsável. Vamos comentar sobre elas nos próximos posts.

 

Autoconhecimento

O Autoconhecimento, ou Autoconsciência, é uma das categorias de competências socioemocionais incluídas na Base Nacional Curricular Comum e nos programas embasados pela Aprendizagem Socioemocional (ASE) já difundidos no país. 

O Autoconhecimento se refere a capacidade do indivíduo de identificar as suas emoçõese pensamentos, identificar e reconhecer suas forças, seus valores e suas limitações. 

O aprendizado da identificação das próprias emoções, bem como de correlacioná-las com fatos e pensamentos, são etapas do aprendizado necessário para tornar-se mais eficiente no gerenciamento de estresse. 

A investigação e apropriação das suas características essenciais (forças de caráter ou virtudes) junto aos seus valores possibilita o reconhecimento dos seus potenciais e clareia o horizonte de atuação social e profissional.

Reconhecer e aprender a respeitar os próprios limites evita o desgaste que surge nas tentativas de superá-los para atender as expectativas alheias. Isso é de grande importância para quem deseja ser mais gentil e compassivo consigo. Além disso, reconhecer e respeitar os próprios limites estimula o desenvolvimento de conexões, na medida em que se aprende a pedir ajuda.

Investir em Autoconhecimento numa perspectiva positiva, em busca de crescimento, é dar-se a chance de ser protagonista da sua própria história!

 

Autocontrole

O Autocontrole, ou Auto Regulação, é outra categoria de competência socioemocional incluída na Base Nacional Curricular Comum e nos programas embasados pela Aprendizagem Socioemocional (ASE) já difundidos no país. 

O Autocontrole relaciona-se a capacidade de gerenciar as próprias emoções, pensamentos e comportamentos para chegar a um determinado objetivo, envolvendo motivação, disciplina e persistência diante de desafios, podendo utilizar-se de humor e criatividade. 

O desenvolvimento do Autocontrole estimula o pensar antes de agir, evitando comportamentos reativos e impulsivos, os quais muitas vezes são motivo ou mantenedores de conflitos e dissabores no cotidiano. 

O Autocontrole também é importante para o desenvolvimento da capacidade de se auto motivar em busca de organização e disciplina, estimulando a resiliência e perseverança. 

Na jornada em busca de Autocontrole, os momentos desafiadores- aqueles que exigem busca de solução para problemas não previstos e correção de falhas, são boas oportunidades para estimular as habilidades de criatividade e humor, estimulando crescimento e superação.

 

Habilidades de Relacionamento

As Habilidades de Relacionamento, ou de Relacionamento Interpessoal, representam uma outra categoria de competência socioemocional incluída na Base Nacional Curricular Comum e nos programas embasados pela Aprendizagem Socioemocional (ASE) já difundidos no país. 

A categoria de Habilidades de Relacionamento reflete a capacidade do indivíduo formar e manter parcerias positivas com comprometimento e cooperação, de saber pedir e oferecer ajuda, comunicar-se efetivamente, negociar e lidar de forma satisfatória com conflitos.

Para o desenvolvimento de relacionamentos interpessoais saudáveis é preciso desenvolver escuta ativa e sensível para se conectar com a experiência e emoção do outro, o que chamamos de empatia. 

Também é fundamental aprender a comunicar de forma clara e gentil o que se sente e o que se precisa, para se fazer entendido e compreendido.

Uma comunicação não violenta e respeitosa abre as portas para conexões positivas e viabiliza o entendimento e solução de conflitos. 

 

Consciência Social

A Consciência Social é outra categoria de competência socioemocional incluídas na Base Nacional Curricular Comum e nos programas embasados pela Aprendizagem Socioemocional (ASE) já difundidos no país. 

A Consciência Social se refere a preocupação com o próximo, a capacidade de perceber as emoções do outro, aceitar sentimentos diferentes dos seus, lidar com a diferença e respeitar o próximo.

Como vimos no post sobre Habilidades de Relacionamento, a empatia e o respeito são fundamentais para a construção de relações interpessoais positivas. Do ponto de vista coletivo, para o estabelecimento de relações sociais e convívio de grupos diferentes, elas também são essenciais. A empatia e o respeito são necessários para superarmos as barreiras do preconceito, aceitarmos a diversidade e buscarmos soluções de conflitos em prol de um convívio social com mais justiça e equidade.

 

Tomada de Decisão Responsável

A Tomada de Decisão Responsável é a quinta categoria de competência socioemocionalincluída na Base Nacional Curricular Comum e nos programas embasados pela Aprendizagem Socioemocional (ASE) já difundidos no país. 

A Tomada de Decisão Responsável refere-se à capacidade de fazer escolhas, identificar problemas reais, refletir sobre eles e buscar soluções para os mesmos de forma ética, sem prejudicar aos outros.

A vida constantemente nos coloca em situações nas quais temos que fazer escolhas. Por mais banais que pareçam, as escolhas implicam em ganhos e perdas, nem sempre só para nós, podendo ter implicações para os outros também. 

O aprendizado da reflexão de problemas, exercício da busca de solução, considerando diferentes desfechos possíveis e suas repercussões, para si e para os outros, tende a nos aproximar de decisões mais éticas.

É oportuno lembrar que a omissão da escolha também tem suas implicações e não nos isenta da responsabilidade de não ter claramente assumido uma escolha dentre as possibilidades apresentadas.

Tornar-se um ser autônomo de fato implica em nos tornarmos responsáveis pelas escolhas que fazemos.

 

Competências Socioemocionais, Bem Estar e Saúde

Conversamos sobre as cinco categorias de competências socioemocionais incluídas nos programas de Aprendizagem Socioemocional (ASE) e adotadas pela Base Nacional Curricular Comum pelas escolas, conforme orientação do Ministério da Educação.

Como podemos ver, cada categoria engloba mais de uma habilidade e que as categorias tendem a se relacionar entre si. Quanto mais uma habilidade é estimulada e desenvolvida, maiores serão os ajustamentos emocionais e sociais das crianças e adolescentes. 

O sistema familiar tem papel central no desenvolvimento de cada um de nós. No entanto, na medida em que somos inseridos em novos contextos, da escola a maturidade, temos a possibilidade de vivenciar novas experiências que influenciam no nosso desenvolvimento socioemocional. Quanto mais positivo for o ambiente onde formos inseridos, melhores serão as chances de promoção de um desenvolvimento psicoemocional saudável, especialmente importante para crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade. 

Existem estudos que correlacionam que estados mais elaborados de habilidades socioemocionais se correlacionam com melhor saúde psicológica, aprendizado, exercício de cidadania, sucesso pessoal e profissional. 

Portanto, investir nestas habilidades é investir em bem estar e saúde!

 

Potenciais Benefícios das Competências Socioemocionais para Crianças e Adolescentes

Dados de pesquisas mostram que existe uma variabilidade na percepção de desenvolvimento das competências socioemocionais ao longo da infância e adolescência. Ao longo do desenvolvimento infantojuvenil, as modificações no corpo e na interação com o ambiente família-escola se modificam, o que justifica esta variabilidade na percepção de desenvolvimento das competências socioemocionais entre as diferentes faixas etárias.

No Brasil, uma pesquisa realizada pelo Instituto Ayrton Senna em parceria com o governo do estado de São Paulo revelou que alunos do 5º ano do ensino fundamental têm menos desenvolvidas empatia, responsabilidade e curiosidade em aprender. Já os alunos do 9º ano, têm como menos desenvolvidas a autoconfiança, a determinação e a curiosidade em aprender, e os do 3º ano do ensino médio: a confiança e a persistência. A partir destes dados, estratégias para melhorar estes resultados podem ser aplicadas, como medidas para estimular a capacidade de autogestão, de abertura ao que é novo, amabilidade e resiliência. 

Além de terem o potencial de melhorar o desempenho escolar, o aprimoramento das habilidades para desenvolvimento de competências socioemocionais tem potencial para melhorar a saúde mental e reduzir o risco de abandono escolar e a violência nas escolas.

O que se espera em longo prazo, é que a inclusão do ensino das competências socioemocionais nas escolas, tenha impacto na redução das desigualdades de oportunidades e possibilite que nossos jovens desenvolvam e realizem seus projetos de vida.

 

Competências Socioemocionais e Mercado de Trabalho

Em diversos setores do mercado de trabalho, as competências socioemocionais têm sido cada vez mais apreciadas e valorizadas, tanto quanto ou mais que a capacidade técnica.Esta tendência tem sido particularmente observada nos ambientes onde as atividades executadas por humanos vêm sendo progressivamente substituídas por máquinas.

Indivíduos com melhor capacidade de comunicação (escuta ativa, expressão clara de ideias), colaborativos nos trabalhos em equipe, abertos a novos aprendizados, autoconfiantes, com melhor gestão de tempo, perseverantes e com proatividade na busca de solução de problemas tendem a se destacar e ser mais valorizados.

Muitas empresas consideram que indivíduos com estas competências socioemocionais desenvolvidas apresentam melhor convívio no trabalho, são mais adaptáveis as mudanças coorporativas e tem maior potencial de se tornarem bons líderes.

 

Como posso me aprimorar em competências socioemocionais?

Ao longo dos últimos posts conversamos sobre as competências socioemocionais, em especial como elas têm sido valorizadas na educação e mercado de trabalho para atender as demandas do mundo BANI.

Pode ser que depois de acompanhar esta série de posts, você tenha, em algum momento, se questionado sobre como você se encontra em relação a estas competências. E, talvez, suas reflexões tenham conduzindo-o a constatação de que é preciso se aperfeiçoar em alguma(s) delas, para se tornar uma pessoa melhor, uma mãe ou pai melhor e/ ou um profissional melhor.

Se este for o seu desejo, sugiro que comece a se ‘alfabetizar’ quanto as suas próprias emoções- permita-se se auto-observar e tente identificar suas emoções e sentimentos diante de fatos e pensamentos. 

Investir em autoconhecimento é o primeiro passo para aprender a gerenciar as suas emoções e trilhar um caminho para aperfeiçoar sua inteligência emocional. Não é preciso ter conflitos para buscar ajuda profissional para isso, basta simplesmente querer se conhecer e se tornar um ser humano melhor.